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Congresso discute aumento da rentabilidade do FGTS

Nove projetos de lei em tramitação alteram o índice de correção ou facilitam saques do fundo, que teve uma perda média de 20% nos últimos dez anos

O trabalhador brasileiro perdeu, em média, 20% do valor depositado nos últimos dez anos no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Para corrigir essa distorção, nove projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional aumentam a rentabilidade de um dos poucos patrimônios do trabalhador brasileiro.

Todo mês, os patrões de quem têm carteira assinada depositam 8% dos salários dos empregados no fundo. Mas o dinheiro é remunerado pela Caixa Econômica abaixo até da inflação, o que resulta em prejuízo para os trabalhadores, segundo a ONG Instituto FGTS Fácil, responsável pelo cálculo das perdas ocorridas na última década.

De acordo com cálculos do instituto, a remuneração atual do fundo resultou em prejuízos de R$ 53 bilhões aos trabalhadores entre 2002 e 2009. O valor corresponde quase ao dobro dos R$ 28 bilhões previstos inicialmente para a realização das Olimpíadas no Rio em 2016.

Os projetos de leis em análise no Congresso mudam o atual índice de correção do fundo, formado pela Taxa Referencial (TR) e mais 3% ao ano. No lugar da TR, colocam o Instituto Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) e o Índice de Preços ao Consumidor Amplo IPCA, usados pelo governo como indicadores oficiais para medir a inflação. Além da atualização inflacionária, os projetos mantêm os 3% de rendimento ao ano.

Exemplos práticos

Um funcionário que há dez anos ganhava R$ 465 (valor do atual salário mínimo) perdeu R$ 1.422,92 na remuneração de seu depósito de lá pra cá, por causa da TR. Caso tivesse sido aplicado o IPCA, teria acumulado um ganho de R$ 7.262,76.

A perda é semelhante para o trabalhador que ganha R$ 1.000. Com a atual legislação, viu R$ 3.060,03 sumirem de sua conta. Com o IPCA, teria acumulado um ganho de R$ 15.619,63. Os dados fazem parte de simulação feita pelo Instituto FGTS Fácil a pedido do Congresso em Foco.

Leia a relação de projetos

Os projetos de lei mais abrangentes são o PLS 581/2007, em tramitação na Comissão de Assuntos Sociais do Senado, e o PL 4566/2008, na Comissão de Trabalho da Câmara, que propõem mudanças mais profundas no fundo de garantia.

As propostas têm origem em estudos do Instituto FGTS Fácil, que colheu 20 mil assinaturas a favor dos projetos. A iniciativa chegou ao Congresso como uma sugestão na Comissão de Legislação Participativa, que concordou com cinco pontos propostos, entre eles a correção pelo IPCA e mais 3% ao ano.

A matéria foi retirada de pauta, mas já tem parecer favorável do relator, Roberto Santiago (PV-SP). No Senado, o senador Paulo Paim (PT-RS) encampou a ideia integralmente, colocando a correção pelo INPC e mais 3% ao ano. A matéria está na Comissão de Assuntos Sociais e ainda aguarda um relator.

Aplicação em ações

Os projetos de lei ainda “turbinam” as contas do fundo com outras duas medidas. Os trabalhadores terão direito a investir uma parcela de seu FGTS em ações de quaisquer empresas. O percentual varia de 5% a 20%, de acordo com as proposições. Além disso, os lucros que a Caixa Econômica tem ao aplicar o FGTS dos trabalhadores em fundos de investimento deverão ser repartidos entre os funcionários com contas vinculadas. Os percentuais variam de acordo com as propostas e podem chegar à metade da rentabilidade dos investimentos.

Quando um empregador deposita o fundo de garantia com atraso na Caixa, tem de pagar uma multa ao governo. As propostas destinam parte dessas multas ao FGTS dos funcionários.

Os projetos em tramitação no Congresso também reduzem o prazo para saque do fundo de garantia em caso de inatividade. A lei atual determina que, após três anos sem movimentação das contas, o dinheiro pode ser sacado pelo trabalhador que não estiver empregado com carteira. As propostas reduzem esse prazo para um ano.

Uma ideia polêmica é mudar a composição do Conselho Curador do FGTS, responsável por regular normas mais específicas do fundo, e ainda decidir onde serão investidos os R$ 229 bilhões acumulados nos seus 43 anos de existência. A proposta quer que governo, patrões e funcionários tenham o mesmo número de membros no colegiado. Atualmente, os empregados e empresários têm quatro membros cada. O governo tem oito e a presidência do Conselho, que sempre é o ministro do Trabalho.

Questão de justiça

Segundo o presidente do Instituto FGTS Fácil, Mário Avelino, as propostas não mudam os objetivos nem reduzem o volume de dinheiro guardado no fundo de garantia. “As nossas demandas não são de mordomias, mas de Justiça”, diz ele.

O deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), o Paulinho da Força, defende a aprovação dos projetos que aumentam a rentabilidade do FGTS. “Esses são projetos que interessam. Num deles fiz emenda para investirmos até 15% para ações do pré-sal na Petrobras”, conta o parlamentar, presidente da Força Sindical e membro da Comissão de Trabalho.

O relator do PL 4566/2008, Roberto Santiago, acredita que a mobilização do Parlamento vai impedir o governo de barrar a aprovação dos projetos no Congresso. “A Caixa Econômica não quer aumentar a rentabilidade. Eles fazem pressão nesse sentido”, acusa. “Mas eu quero ver a maioria do governo ir contra o fator previdenciário, contra o vale-cultura para os aposentados”, provoca Santiago.

Bolsa de valores

Paulinho trabalha para a Medida Provisória 464, que permite ao funcionário aplicar até 30% do FGTS em fundo de investimento do Programa de Aceleração do Crescimento, ser aprovada na Câmara e não ser vetada pelo presidente Lula. O deputado defende que os projetos em tramitação incluam mais possibilidade de se investir o fundo de garantia em ações na bolsa de valores.

“Eu defendo que o funcionário possa investir seu FGTS em ações na empresa em que trabalha. Isso aumenta o comprometimento, a responsabilidade. Até para fazer greve, é mais difícil. Com certeza, isso tem apoio do patronato”, diz Paulinho, presidente da Força Sindical.

O senador Paulo Paim é a favor das medidas que aumentam a rentabilidade do fundo. Ele diz que há possibilidade de se negociar com o governo e a Caixa Econômica, que certamente serão contra as propostas, por aumentarem as despesas do banco. “Temos de dialogar. A formulação do fundo tem que ser alterada”, diz o senador petista.

Paim defende as aplicações em bolsa de valores como opção para aumentar os ganhos dos trabalhadores, mas apenas em investimentos seguros, como a Petrobras. “Investir em ações da própria empresa pode ser perigoso”, conta. O gaúcho teme situações em que, em vez de demitir, o patrão proponha ao funcionário comprar ações da empresa em que trabalha.

O que diz a Caixa

Em resposta ao Congresso em Foco, a assessoria da Caixa disse que o banco não comenta projetos de lei. Mas a Caixa nega que o FGTS seja remunerado abaixo da inflação. Segundo a assessoria de imprensa da instituição, eventuais perdas vão ser compensadas com o tempo.

Bastaria assim esperar os anos passarem, para todos os índices inflacionários se mostrarem idênticos. Ou seja, se o trabalhador aguardar, não perderá nada.

“No longo prazo, todos os indicadores tendem a se igualar. Se pegar determinados períodos, ora os indicadores de inflação ganham do rendimento do FGTS, ora perdem”, alega a assessoria.

Eduardo Militão (Congresso em Foco)

 

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