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CTB apoia o 3º PNDH e sugere leitura atenta do documento

Há algumas semanas o governo federal vem sendo bombardeado por diversos setores da sociedade, naquele que talvez seja o ataque mais bem orquestrado das forças conservadoras do país desde o advento do chamado “mensalão”, em 2005. O alvo dessa fúria é o 3º Programa Nacional de Direitos Humanos, documento de caráter progressista assinado por 26 ministros e cujo conteúdo tem total respaldo da CTB.

Diante de toda essa controvérsia, antes de defender ou atacar o PNDH-3, cabe a qualquer liderança responsável sugerir algo simples: a leitura do documento, disponível na internet pela Presidência da República.

As principais críticas ao documento de 228 páginas (nas quais estão incluídos, como anexos, o 1º e o 2º PNDH) se concentram no conteúdo do Eixo Orientador VI, que trata do Direito à Memória e à Verdade. Para os mais alarmados, trata-se de uma defesa da extinção da Lei de Anistia, de 1979. Uma simples passada de olhos pela página 170 do texto mostra o contrário:

“O Brasil ainda processa com dificuldades o resgate da memória e da verdade sobre o que ocorreu com as vítimas atingidas pela repressão política durante o regime de 1964. A impossibilidade de acesso a todas as informações oficiais impede que familiares de mortos e desaparecidos possam conhecer os fatos relacionados aos crimes praticados e não permite à sociedade elaborar seus próprios conceitos sobre aquele período.”

O PNDH-3 é bem claro: não se prevê em qualquer de seus parágrafos acabar com a Lei de Anistia. O que o texto defende é o fato inegável de que para que quaisquer ações em nome da memória e da verdade prosperarem, é necessário ter acesso a informações que constam em arquivos secretos, restritos à sociedade em geral e em poder das Forças Armadas.

Para tanto, o documento propõe (repita-se: propõe!) a criação de um Grupo de Trabalho para discutir e avaliar, em conjunto com o Congresso Nacional, iniciativas que revoguem quaisquer leis que sejam contrárias à garantia dos Direitos Humanos, a partir de um conceito juridicamente irrefutável: tortura é um crime (1) imprescritível e (2) contra a humanidade.

Jobim e a tese do revanchismo

O ministro da Defesa, Nelson Jobim, parece ter-se esquecido de seu papel durante o governo Fernando Henrique Cardoso, quando foi um dos responsáveis pela primeira versão do PNDH. Enquanto os militares atacam a ideia de “revanchismo” supostamente contida no documento, Jobim esquece-se de que não se trata de uma ação governamental contra setor X ou Y das Forças Armadas.

O PNDH-3 é muito mais amplo do que qualquer investida dessa natureza. Um exemplo dessa orientação é lembrado pelo desembargador Wálter Fanganiello Maierovitch, em artigo para a revista “CartaCapital”. Diz ele que a Comissão Nacional da Verdade, a ser criada até abril deste ano, não se limitará a analisar o período entre 1964-85, mas realizará “também levantamento histórico a respeito da ditadura Vargas”.

Outro aspecto importante é o de que as Forças Armadas podem sair com a imagem fortalecida após o trabalho dessa Comissão. Como bem lembra Maierovitch, “a responsabilidade criminal, por imprescritíveis crimes de lesa-humanidade e terrorismo de Estado recai sobre a pessoa do infrator e não na corporação, Exército, Marinha ou Aeronáutica”.

Cabe ao Brasil, ainda, diante de seu papel ascendente na geopolítica do século 21, dar um belo exemplo ao mundo — tal qual fizeram outras nações que também enfrentaram ditaduras sangrentas — e esclarecer as contas com seu passado.

Paulo Sergio Pinheiro, diplomata, membro da Comissão Interamericana de Direitos Humanos e um dos autores da segunda versão do PNDH, ainda no governo FHC, lembra do aspecto sui generis dos militares brasileiros no que diz respeito ao passado de suas corporações. “O Brasil é o único país em que as Forças Armadas continuam tendo essa solidariedade com o passado. É evidente que as Forças Armadas de hoje não têm nada a ver com um bando de torturadores e militares e policiais que fizeram os desaparecimentos”, afirmou, em entrevista à CBN.

Abrangência

Mas não são apenas os militares que vêm bombardeando o governo federal devido ao PNDH-3. Setores díspares como veículos de comunicação, igreja, empresários e agricultores têm-se dedicado a atacar o programa, caracterizando-o com argumentos como “atentado à liberdade” e usando de desqualificações das mais variadas.

Uma breve explicação histórica rebate os argumentos de tais nichos da sociedade. Os primeiros programas nacionais de direitos humanos nascem da Declaração de Viena, resultado da Conferência Mundial sobre Direitos Humanos de 1993. O texto faz referência específica aos direitos das mulheres, crianças, índios, bem como trata de aspectos ligados à pobreza, ao racismo, às perseguições a minorias e, obviamente, a torpeza da tortura.

Recente documento divulgado no Brasil pelo Movimento Nacional dos Direitos Humanos (MNDH) também rebate o suposto “problema” da abrangência da proposta redigida pelo governo. “Há setores que estranham que o Programa seja tão abrangente, trate de temas tão diversos. Ignoram que desde há muito, ao menos desde a Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, direitos humanos é muito mais do que direitos civis e políticos. Vários Tratados, Pactos e Convenções internacionais articulam o que é hoje conhecido como o direito internacional dos direitos humanos, que protege direitos de várias dimensões: civis, políticos, econômicos, sociais, culturais, ambientais, de solidariedade, dos povos, entre outras”.

CTB tem lado

Para o presidente da CTB, Wagner Gomes, não somente o governo federal, mas toda a sociedade civil organizada e compromissada com os direitos humanos deve comprar a briga pela defesa do PNDH-3.

“Todos os brasileiros têm o direito de saber o que realmente aconteceu durante os anos de chumbo — e aqueles que cometeram crimes como o de tortura têm que ser devidamente punidos. Além disso, o programa também propõe diversos avanços ligados aos direitos humanos para a sociedade brasileira, razão pela qual o movimento sindical e a classe trabalhadora devem se posicionar claramente a seu favor”, argumentou.

Clique aqui para ler a íntegra do documento

Fernando Damasceno – Portal CTB

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